Mulheres representam somente 24,3% do empreendedorismo tecnológico em Santa Catarina

Mulheres representam somente 24,3% do empreendedorismo tecnológico em Santa Catarina Marco Favero/Agência RBS

Ada Lovelace não gostava de tricô. A matemática contrariou o próprio pai, o poeta Lord Byron, que dizia que "as mulheres deveriam se ocupar dos afazeres domésticos". Dedicou-se às ciências exatas graças à mãe e afastou-se das amigas inglesas do século 19 por falta de interesses em comum.  
A irreverência da moça de sangue byroniano fez com que ela acompanhasse de perto a criação do computador. Ada trocava correspondências com o engenheiro inglêsCharles Babbage, considerado o pai da computação, que a chamava de "encantadora de números". Em 1842, ela escreveu o primeiro algoritmo para computador – fórmula para as bases da ciência da computação. Também viu que a máquina tinha funções que iam além da calculadora. 
A sociedade ainda está em dívida com Ada passados mais de dois séculos. Isso porque as mulheres têm papel coadjuvante na tecnologia
Virginia M. Rometty (IBM) e Meg Whitman (Hewlett-Packard) são as únicas CEOs na lista das maiores corporações de Tecnologia da Informação (TI) do mundo. Na ranking de 15 bilionários da tecnologia em 2015 formulada pela Forbes, só há uma mulher. Laurene Powell Jobs é herdeira (Apple e Pixar) e não fundadora, como todos os outros integrantes do levantamento. Apesar de defasado, o Censo de 2010 no Brasil mostra que o mesmo acontece aqui: as colaboradoras são somente um quarto das 520 mil pessoas que trabalham no segmento.
Santa Catarina, cuja capital Florianópolis é tida como o Vale do Silício brasileiro e tem grandes polos do setor como Blumenau e Joinville, tem diagnóstico desigual quase na mesma proporção: as 2.893 empresas de tecnologia têm 5.568 sócios homens contra 1.357 sócias mulheres (24,37%). Os números repassados ao Diário Catarinense são da Associação Catarinense de Empresas de Tecnologia em parceria com a Neoway. 
Incomodadas com a baixa representatividade no setor, o grupo Anitas foi criado por três mulheres para conectar, capacitar e incentivar o empreendedorismo feminino nas ciências da computação na Grande Florianópolis. Júlia Machado, 32 anos, Ana Locks, 28, e Mariana Scaff, 22, acreditam que, se mulheres querem aprender a programar e abrir os próprios negócios, elas podem. 
– Tudo começou em um Startup SC [evento promovido pelo Sebrae], do qual eu e a Ana participamos com somente oito mulheres de um total de 26 empresas. E nenhuma tinha formação técnica, porque geralmente nós somos inseguras para atuar nessa área. Se depender do Anitas, isso vai mudar com encontros mensais, workshops de tecnologia e empreendedorismo, networking e incentivo aos programas de diversidade nas empresas – explica Júlia, idealizadora do grupo que se apoia na heroína catarinense Anita Garibaldi, contemporânea à Ada Lovelace. 
Já foram três encontros mensais desde novembro de 2015 com a participação de mais de 200 mulheres envolvidas com o polo tecnológico da região. Em fevereiro, tem início a agenda de cursos técnicos mensais gratuitos com Introdução ao CSS e HTML – linguagens de programação. No mês seguinte, ensinamentos de Customer Development serão repassados pelas jovens. O Grupo Anitas também apoia e dissemina as seguintes iniciativas existentes na Grande Florianópolis: PyLadies, Technovation Challenge, JS-Girls e Startup Weekend Woman, do Sebrae.
Barreiras para sucesso feminino envolvem criação e universidade
As mulheres compõem apenas 15% do corpo discente nas faculdades de Tecnologia da Informação no Brasil, conforme o Censo da Educação Superior de 2012. Nas 15 opções de graduação relacionadas à tecnologia oferecidas pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), a presença feminina costuma ser de em média 34,4% nos últimos quatro vestibulares. Elas procuraram mais essa formação neste semestre e são 39%, conforme a Pró-Reitoria de Ensino da universidade. Formada em Sistemas Eletrônicos pelo Instituto Federal de Santa Catarina, Kamila Hinckel, acredita que esse montante seja ainda menor no dia da colação de grau:
– Eu procurava um lugar para me sentar escondida na sala, não gostava de chamar a atenção para mim. Mas os professores sempre me viam, alguns deles fazem a pessoa achar que não deveria estar ali. Há poucas meninas que entram e as que entram muitas vezes deparam-se com comentários um pouco preconceituosos e acabam desistindo – conta a desenvolvedora.
Ela hoje sente-se segura, mas quando iniciou a carreira sentia-se uma "impostora" – comportamento comum a algumas mulheres descrito no livro Faça Acontecer, da executiva Sharyl Sandberg
Para a graduanda em Ciências da Computação e uma das fundadoras do Anitas,Mariana Scaff, a baixa procura por cursos de computação é reflexo da criação:
– Eu adorava Lego, mas só podia brincar quando meu irmão estava junto. O computador também ficava no quarto do meu irmão. Isso tudo faz com que a gente chegue na escola e não goste de ciências exatas – contextualiza. 
Emília Chagas, 32, é sócia-fundadora da start-up catarinense Contentools com três homens. Assim como a maioria das empresas de pequeno e médio porte da região, ela não dispõe de uma política específica de igualdade de gênero na empresa. Mas mostra-se aberta a contratar mulheres. 
– Mulheres líderes devem ter a preocupação de terem times diversos. A monocultura fere quem a cria. Mas nem sempre é fácil encontrar mulheres para preencher as vagas abertas. O gender gap (lacuna de gênero) é uma realidade aqui e no Vale do Silício – garante a empreendedora, cujo negócio é acelerado na Califórnia. 
Homens se mobilizam contra desigualdade
Mulheres diferem dos homens em empresas de tecnologia tanto na ocupação, quanto na remuneração. Não há dados catarinenses da realidade, mas o Censo 2010 assegura que o salário das mulheres empregadas em TI no Brasil era 34% menor que o dos homens. Em razão da co-participação, a consultora da organização de empoderamento feminino Springboard Brasil, Corinne Giely-Eloi, acredita que os homens devem ser envolvidos nesses processos de desconstrução. 
– Precisamos dos homens para nos apoiar. Esse não é só um problema feminino. Aqui na Grande Florianópolis, eu ainda preciso explicar para a maioria das empresas o que é empoderamento. Mas em cinco anos eu espero não ter mais esse trabalho – torce a francesa radicada em Santa Catarina, que se diz favorável à implementação de cotas para mulheres em conselhos de empresas. 
No início do ano, o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, respondeu um comentário que incentivava garotas a "namorarem os nerds da escola". Ele, então, encorajou as mulheres a serem protagonistas na área da tecnologia.
Corinne Giely-Eloi, especialista em empoderamento feminino, também acredita no 
papel dos homens para mudança do quadro desigual
Foto: Felipe Carneiro / Agencia RBS
UNIVERSIDADE
As mulheres compõem apenas 15% dos alunos nas faculdades de Tecnologia da Informação no Brasil, conforme o Censo da Educação Superior de 2012. 

Nos últimos quatro vestibulares, as 15 opções de cursos relacionados à tecnologia pela Udesc tiveram em média 34,4% de presença feminina.
EMPRESAS
No Censo de 2010, as mulheres representam somente 1/4 dos 520 mil profissionais do segmento.

Sócios em empresas de tecnologia
Homens - 74,5%
Mulheres - 25,5%
Faixa etária: 60% dos sócios das empresas de tecnologia do estado de SC tem idade entre 29 e 43 anos.

Colaboradores
Homens - 61,6%
Mulheres - 38,4%

Fontes: Acate/Neoway, IBGE, Udesc
http://dc.clicrbs.com.br/sc/estilo-de-vida/noticia/2016/02/mulheres-representam-somente-24-3-do-empreendedorismo-tecnologico-em-santa-catarina-4981668.html

Comentários

#Fale conosco

Nome

E-mail *

Mensagem *