Violência, prisões e PEC da maioridade são alguns dos abusos citados, mas País é elogiado por abertura aos refugiados sírios. O Brasil foi citado no Relatório Mundial 2016 da organização Human Rights Watch – que compila abusos de Direitos Humanos em 90 países – pela violência policial e pela superlotação do sistema prisional.
Protesto contra violência policial
Foto: Daniel Ramalho / Terra
A 26º edição do relatório foi lançada nesta quarta-feira em Istambul. O
documento afirma essencialmente que vários governos do planeta
reduziram a proteção aos direitos humanos em nome da segurança – e por
medo da disseminação de ações terroristas fora do Oriente Médio. Segundo a organização, os governos europeus têm fechado suas fronteiras
para o fluxo massivo de refugiados fugindo principalmente do conflito
sírio – deixando a responsabilidade de lidar com a questão para países
vizinhos à Síria.
Algumas das consequências são a islamofobia e a estigmatização de
comunidades de imigrantes. Segundo Maria Laura Canineu, diretora do
escritório brasileiro da HRW, o Brasil adotou uma ação positiva na
questão dos refugiados. "O Brasil merece aplausos pela aceitação e pela
abertura aos refugiados, principalmente sírios. Foram concedidos mais de
8 mil vistos humanitários. A questão agora é criar oportunidades de
trabalho para eles", disse.
O Brasil porém recebeu destaque negativo devido ao alto número de
pessoas assassinadas pela polícia – 3 mil em 2014 – e pela superlotação
das cadeias, que supera sua capacidade de vagas em 61%. Segundo ela, no
campo de abusos de violência na área de segurança pública, o Brasil
enfrenta um dos piores cenários na comparação com os outros países.
"A situação (de violência policial) não melhora, só piora. Acreditamos
que isso acontece devido a um fracasso generalizado das instituições em
combater a impunidade", disse Canineu. Segundo ela, a situação no ano
passado foi agravada por esforços de grupos políticos em aprovar
legislações que tentam "regredir" as conquistas na área de direitos
humanos.O documento da HRW critica o histórico do ano no País em nove áreas
sensíveis do ponto de vista dos direitos humanos. Leia abaixo os
principais pontos:
Segurança Pública
A Human Rights Watch critica o Brasil especialmente em relação à
violência policial e à superlotação dos presídios. A organização alertou
para o crescimento de 40% no número de pessoas assassinadas por forças
de segurança no Brasil em 2014 (a estatística mais recente disponível na
época da elaboração do documento). Segundo dados levantados pelo Fórum
Nacional de Segurança Pública, foram cerca de 3 mil vítimas em todo o
Brasil.
O relatório ressalta que parte dessas mortes são resultados de
confrontos, nos quais a polícia usa a força de forma legítima. Contudo,
uma outra parcela dos assassinatos são na realidade execuções
extrajudiciais.
O documento também critica o envolvimento de policiais em casos de
chacinas em diversos Estados. Em relação aos presídios, a HRW sublinha
que a superlotação e a falta de pessoal tornam impossível às autoridades
controlar os presídios. O sistema prisional do País abriga atualmente
cerca de 600 mil pessoas – um número 61% maior que a capacidade total.
Essa situação deixa os detentos "vulneráveis à violência e às facções
criminosas, como documentado pela organização nos Estados de Pernambuco e
do Maranhão."
A ONG elogia porém, experiências de alguns Estados, nos quais presos
são levados rapidamente à presença de um juiz. Para a HRW, as audiências
de custódia podem ajudar a diminuir a superlotação – reduzindo o número
de presos provisórios – e os casos de tortura.
Direitos das crianças
A ONG criticou uma iniciativa da Câmara dos Deputados, que aprovou uma
proposta de emenda constitucional que pode fazer com que adolescentes de
16 e 17 anos, acusados de crimes graves, sejam julgados e condenados
como adultos. A PEC da maioridade penal ainda precisa de aprovação do
Senado para entrar em vigor.
Liberdade de expressão e associação
A tramitação no Congresso de uma lei de combate ao terrorismo foi
criticada pela HRW. Segundo a organização, ela "contém termos
excessivamente genéricos e linguagem vaga" e pode ser usada para
processar criminalmente manifestantes e membros de movimentos sociais. A
organização também critica os assassinatos de ao menos sete jornalistas
e blogueiros em 2015.
Direitos reprodutivos
Como o aborto é ilegal no Brasil, a preocupação da HRW em relação ao
tema diz respeito ao risco que as mulheres e adolescentes correm ao se
submeterem a procedimentos clandestinos. O aborto só é permitido no País em casos de estupro, anencefalia (casos
em que o feto possui má formação congênita fatal) ou quando a vida da
mãe está em risco. A Câmara analisa proposta para derrubar essas
exceções.
Orientação sexual
Segundo a HRW, a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos recebeu 522
denúncias de violência e discriminação contra gays, lésbicas, bissexuais
e transgêneros só na primeira metade de 2015.
O relatório cita um projeto de lei discutido no Congresso que define a
família apenas como a união de um homem com uma mulher – embora
tribunais de instâncias superiores tenham decidido favoravelmente ao
casamento de pessoas de mesmo sexo.
Direitos trabalhistas
Na área do trabalho, a organização de direitos humanos aponta para a
grande quantidade de casos de pessoas submetidas a condições de trabalho
consideradas abusivas. Ela incluiu em seu relatório levantamento do
Ministério do Trabalho segundo o qual mais de 48 mil casos de
trabalhadores sujeitos a trabalhos forçados, condições degradantes e
condições análogas à escravidão foram documentados desde 2015.
Violência no campo
A HRW criticou assassinatos de indígenas e camponeses supostamente a
mando de fazendeiros e criminosos envolvidos com madeireiras
ilegais. Como exemplos, a organização citou "violentos ataques" contra
os índios guarani-kaiowá por parte de pessoas ligadas a fazendeiros no
Mato Grosso do Sul. Esses índios lutam atualmente para reaver suas
terras ancestrais. Um deles foi assassinado em uma ação ainda sob
investigação.
Regime militar
O relatório final da Comissão Nacional da Verdade sobre violações de direitos humanos pelo
regime militar que governou o País entre 1964 e 1985, divulgado no fim
de 2014, também foi citado pela organização. A HRW afirma que, embora 377 suspeitos de violações de direitos humanos
tenham sido identificados, a Lei da Anistia, de 1979, impede que
eles sejam levados à Justiça. A organização ressalta que casos isolados
de tentativa de processar suspeitos estão temporariamente suspensos à
espera de uma eventual reavaliação da Lei da Anistia.
Política externa
A ONG classificou a atuação brasileira no Conselho de Direitos Humanos
como "inconsistente". Isso porque o País teria apoiado decisões em favor
dos direitos humanos em certas ocasiões e, em outras circunstâncias, se
absteve de votar em questões semelhantes (especialmente envolvendo o no
conflito da Síria). O relatório elogiou porém a postura do Brasil em liderar a defesa do direito à privacidade na era digital.
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